domingo, 31 de outubro de 2010

Infância


O doce do tempo, passa ao seu sabor.
Correr ao vento, sem sofrimento.
Ser sincero e tocar o amor.
Brincar de crescer. Aprender a viver.
O sangue, o choro e o seu inventor.
Andar de mãos dadas, correr nas calçadas.
Ouvir chamar e não dar valor.
Ser inocente. Displicente, sem perder o calor.
Pular corda, de forma singela.
Aos poucos surgem portinhas e janelas.
Meninos, meninas, eles e elas.
Escrever na terra, amigos para sempre.
Recriando uma fala, para que todos se lembrem.
Quão doce é a inconstância
Quão leve e suave é a infância.
Esconde-esconde, a infelicidade.
Suba alto, veja toda cidade.
Corra rápido, atrás do seu sonho.
Pule amarelinha, sem medo de ser enfadonho.
Fazer a casinha? É ver o futuro.
Traçar uma linha, criar um muro.
Rir da roupa, que possuí um furo.
Ter na cintura, o bambolê.
Roubar a bola e gritar: Olê.
Cortar o cabelo, com as próprias mãos.
Ousar e arriscar, ouvir um sermão.
Quão amável é ser aprendiz.
Estar na escola, tocar o giz.
Ter no peito, um imenso coração.
Chorar e gritar, ao escutar não.
Rir, ao ver um curioso bichinho.
Ter medo e soluçar baixinho.
Segurar a mão, com toda força.
Passar um batom e sentir-se moça.
Olhar o pai, e desafiá-lo.
Correr atrás do sopro e não apanhá-lo.
Ser príncipe e ter um castelo.
Ser cavalheiro e lutar com um martelo.
Ver-se princesa, em um belo vestido.
Trazer nos olhos um segredo incutido.
Quão belo é viver qualquer circunstância.
Quão delicioso é viver a infância.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Ruas de Lágrimas


Há um grande edifício
Abrigado em meu olhar
Não há nos rosto indícios
Nem alugueis a se cobrar

Tantas ruas já andei,
Sem ter onde morar
Muitas delas provoquei,
E outras tantas ei de causar.

Mergulhei nas moradias
Tão salobras e tão frágeis
Alimentei dia após dia
Com angústia ou risos ágeis.

Pouco se sabe destas ruas
Não preciso eu saber
O sabor que dela sobra
A dor da alma dobra
Traz um novo amanhecer.

Caminhei nelas em tantas luas
Conheço bem cada pedrinha
Observei-a quando nuas
Limpei-as sempre sozinha.

Fui um grande zelador
Sempre as tratei com todo amor
Sempre foram minhas ruas
Cada uma das duas
Cobertas de esplendor

Penso eu na noite cortante
Em que o frio açoita meu ser
O quanto são importantes
As ruas do meu viver?

Os ladrilhos que as compõe
São chamados sentimentos
Não há quem as sobrepõe
Em um momento de sofrimento

Os ladrilhos que as compõe
Tem o nome de alegria
Não há que se impõe
Ao riso que contagia

Os ladrilhos que as compõe
Tem sabor de vitória
Não há ser que não dispõe
Ruas surgidas da glória

Na noite cortante reflito
Estas ruas tão bem-vindas
Causam por vezes conflitos
Nesta vida desvalida
Onde os ladrilhos são aflitos
Perante desatinos da lida.

Na noite cortante apedrejo
O que a mim coube entender
As ruas que eu despejo
Cada uma irei colher

Lágrimas logradas do mundo
Defraudei sem perceber
Lágrimas logradas do mundo
São as ruas quais vou viver.

domingo, 3 de outubro de 2010

Coraçãozinho


Lembro quando era pequeno e a luz ficava acesa
Não tinha medo do escuro.
Queria apenas contemplar sua beleza.
Se eu ouvisse as histórias de “era uma vez”,
Não dormia na esperança de te ler no outro mês.

Cresci como exigiu e parei de crê no amor.
Foi como perder o chão e fazer frio em abril.
Viver em um rio de torpor, tudo branco em anil.
Segurei sua mão, naquele ato infantil.
Fui sua caça e o predador, o que é servido e o que serviu.

No dia que você se foi, um mal me acometeu.
Minha alma secou-se e meu rosto enrubesceu
Cada lágrima que chorei
Despejei pelo amor seu.

Sempre fora a mais bela
Outra igual na Terra não há.
Era minha cinderela
A dama por quem zelar

Sofri mil terrores, por teu rosto não avistar.
É a dona dos amores. Como ti outra não há.
Atei-me a fiel esperança
De ser ao mundo sua herança
Alguém a te representar.

Você mentiu para mim.
Disse que jamais me deixaria.
Quando estava partindo ao fim.
Percebi que para sempre me amaria.

Era o meu belo tesouro, por ti vou além.
A terra que a enterra, está também em meu coração.
Não importa o que aconteça, tenho cá, tua proteção.
Sou e sempre serei seu lindo neném.
Mãe. Sempre te amei. E sei que me amas também.

sábado, 2 de outubro de 2010

Meu Pedaçinho de Terra.


Nasci em uma terra
Onde o chão é rachado;
Os semblantes maltratados
Onde o povo vive de crer.

Na minha terra
[Que não é minha]
Todo dia tem romaria,
O padre reza a ladainha
E me dá fé para vencer.

A água que é tão rara
Mora dentro do açude.
A gente viaja de pau-de-arara
Mão cansada e peito rude.

Quando a água despeja do céu
Forma a lama bem-vinda.
A viúva retira o véu,
Em festa a noite finda

Minha terra tem passarinho
Com o peito miádo vive a cantar;
Canto este que afasta o espinho
E lembra o cheiro do mar.

A terrinha ressacada
Abriga as mãos sofridas.
Não tem remédio para ferida
Não há água fonte da vida
E comida também não há.

Os trapos que peito cobre
São finos, cosidos à mão.
Mãos tão calejadas e tão nobres
Mãos que acalentam o chão;

A única água que corre
É aquela que dos olhos caí.
Quando um dos filhos morre
Da fome que nunca saí.

Já tentei plantar de tudo,
E de tudo, nada nasceu.
Não quero sair para o mundo
Este lugar também é de Deus.
Não quero sair do mundo
Aqui é feliz o peito meu.

Os bracinhos afinados
Dos tantos filhos que Deus me deu
Todos eles foram criados,
Na terra onde o sol assola
Que é onde cada um cresceu.


Os pés livres e bem andados,
Solado nunca viu.
O chão quente e árido
Calçaram e bem serviu.

A perninha murcha;
Seca de tanto andar.
Os cabelos feitos bucha
Sem ter água para lavar.

A cor dourada que o usufruí
Não é ouro, riqueza não há.
O tesouro que possuí
É o que na terra se enterrará

Aprendi sozinho nesta terra
A fome é nossa guerra.
E não temos armas para lutar.

Aprendi sozinho nesta terra
Minha luta não se encerra.
Enquanto a morte não chegar.

Aprendi sozinho nesta terra
O que este meu peito berra.
Ninguém quer escutar.

É tanta aridez,
Falta de sensatez,
Que chega a me afogar.
Um afogamento doloroso
Nem tem meio aquoso
Que se possa constatar.

Se chorar criasse rios,
Meu sertão seria a terra
Mais rica que a serra
Onde mais água há.

Se chorar acalentasse a fome,
Dos mirrados abdomes
Meu sertão seria a terra
Que minha tristeza desferra
Onde comida há.

Aprendi sozinho nesta terra
O medo que em meu peito ferra,
È que eu morra sem vê-la prosperar.

Aprendi sozinho nesta terra
Que minha vida soterra.
A ser feliz, sem reclamar.