domingo, 27 de fevereiro de 2011

Segunda Pessoa do Singular


Destes dois olhares, para corromper m’alma,
E sem tua derradeira face, tomas minha calma.
Dominastes meu ser, com teu mero sorriso.
Banhastes minha vida e retiraras dela o siso.

Aflito em meu cômodo vazio, pranteio tua partida.
Porque foras e deixaste-me sós; criastes minha ferida;
E nela refugio a distância de um amor interrompido
Postes em meu ar uma espessa nébula, onde me despido.

Pois, não vistes meu ser que clama por tua existência,
Abandonastes a vida, e tudo nela possuí tua essência.
Não! Se for isto um castigo me desponho a cumprir,
Se pelo amor que tu me tinhas, deixaste contigo eu partir.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Inimigo íntimo


Recolho-me em alguma esquina de m’alma.
Agarro-me a todos os vestígios de lucidez,
É sombrio e frio estar só em minhas palmas,
Congratulando a imaginação e a embriaguez.

Escondo-me dos meus olhos de condenação,
Para impedir que eu veja o que transmitem.
Recebo de bom grado a vertigem,
Prefiro sagrar-me louco à aflição.

Sofro as dores de quem parte e pouco viveu,
Vivo estou, embora sinta o que já morreu.
Desfaleço em cada momento, á espera de uma luz,
Cegando meus negros olhos – Que a tal morte me conduz.

Sou clandestino de minha fajuta memória,
Não busco ser grande ou reinar a glória.
Sou um simplório amante da loucura,
É mais fácil render-se a padecer com bravura!

Leito de Dor


Desço a rua, sobre pés que não domino.
Deixo-me levar. De domingo a domingo
Vejo as tardes, elas correm no ar,
Sinto no peito a dor, de vê-las passar.
Preencho o vazio que o tempo formou,
Rugas envoltas de um par, que muito chorou.

O sangue é o que pulsa vitorioso.
Inerte em um corpo há muito glorioso,
Tudo se transforma em borrões e uivos.
Dores, que dilaceram a alma.
A pior delas, a mente acalma.
O temor é mais pesaroso,
Corrói, até o sonho mais fervoroso.

Lágrimas secas, o inverno chegou,
A briga ferrenha. Permaneço e não vou.
Preparações contidas, veladas na memória,
Resguardadas e afundadas na parede da glória.
Sobre os olhos, um véu transpassado.
No dia que estes se selarem, viver é passado.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Só, sorte!


Sou de longa data, um seguidor de poeira.
Tenho fé; Acendo vela e também fogueira.
Nos meus pés anfitriões, abrigo o conhecimento,
Já caminhei por tantas estradas, sob a terra e o cimento.

Trago os consolos, que a vida presenteia.
Sou como a aranha, que cedo tece a teia,
Argumento, com meus olhos, a confiança.
Com meu sorriso pleiteio a sorte e a esperança.

Doce, sou. Docemente me transponho.
Não crio juízos e tão pouco me envergonho,
De mostrar ao mundo que sou um viajante
Que levo a vida sobre os ombros, e sou errante.

Há tempos não sou tão moço,
Há tempos me consagro leigo.
Sorrio de meus pulmões e seu esforço
Pranteio a saudade de possuir um leito.

Tenho tantas indagações, pergunto ao pó.
Não tenho outro a quem indagar, vivo só.
E assim, que tarde me alcance a morte,
Pois viver a margem da vida é para quem tem sorte. Só, sorte.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

O Moço dos Avisos


Os olhos semicerrados, como os sonhos.
Aprofundados na neblina; Displicência.
Uma armadura espessa, ao medo imponho
Não posso transportar o peso da impaciência.

São pedregulhos, esquinas sombrias e vales.
Recrio-me, destruo e transponho. Preservando meus males,
Atravesso o som das águas, no passado me abrigo.
A nuvem densa, uma cerração de desejos; Maldigo.

Assim como vejo, me sirvo. Nos lábios um gosto frugal.
Nos braços dores, no olhar, irônicos sorrisos.
Permaneço, como um amante do decrépito, do mortal.
A ponte elevadiça, a pedra sobre o rio. O Moço dos Avisos.

A minha frente, pelo caminho tudo é ofuscado.
A irritação definha e me acerta, como um dardo.
Exatamente, quando me compreendo um ser transgressor,
Percebo-me frente à morte, promissora é minha dor.

Não suporto, porém devo permanecer com meu fardo.
Sou sofreado pela inocência que conspira com m’alma
Contenho-me, e sigo caminhando. Sou falho, e tardo.
Espelho-me na condição de humano. Ansiando por calma.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

O encontro


Um corpo, sem vida, sem cor.
Lábios intransigentes e secos
Sorrisos duros, faces de dor
Vielas. Ruas. Negros becos.

É como estar de olhos crus,
Estampando aflito o medo
Á vista sonhos nus
Ocultos sob o enredo.

Desde então, parti enfurecido
Domando meu, desconhecido, viver;
Estraçalhando o passado, envelhecido
Encobrindo provas de meu sofrer.

Uma pequena e irrisória despedida
Fez-me ver, sem lucidez, a vivacidade
Crer, que sempre é dia de partida
Deu-me, o fugaz desejo, de felicidade.

“Quem alimenta o desejo de vida, certamente já cruzou com a morte na sua esquina sombria.”
Thaís Milani

Essência Ausente


Corra, vá à longe e esconda-se;
Em um muro, mascara ou sorriso.
Povoe teus olhos com o mais puro aviso
As lágrimas que nele abrigam-se.

Tampe as narinas com odor da descrença.
Asfixie o sonho que nasce na infância.
Impeça a alma de respirar a decência
Mate o desejo e enterre-o com a ânsia.

Cegue teus olhos com o ódio.
Torne a terra imprópria com sódio.
Seque o poço da liberdade, o choro.
Lança-se na lama e usufrua sem decoro.

Compre o sonho que não se concretiza.
Enalteça e enfureça o rancor.
Silencie o lábio que profetiza.
Preencha a vida com dor.

Desabrigue qualquer sentimento.
Deite-se com a morte.
Desrespeite a sorte.
Liberte-se ao vento.

Somente assim sofrerá o luto,
Tornar-se-á astuto,
Aprenderá a crer,
Ensinará a ser.

Desta maneira, quase brutal.
O frágil ser carnal,
Apõe a sua essência,
A necessidade de acrescer a Experiência.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Alma Poeta


Escrevo - pois meus lábios estão privados do canto.
Esta é a maneira mais pura de me proclamar,
Meu verso é a vida de meu pranto,
A minha voz suave a se declarar.

Os pecados de m’alma são supérfluos,
Estão próximos o suficiente para tocar.
Uma parede contém o que é malévolo,
Devo eu a beleza viver e contemplar.

Escrevo - pois as palavras são grandes consoladoras,
Observam atentas e respondem com sabedoria.
Possuem severidade e também melancolia,
São ardentes, auspiciosas; Tentadoras.

O fascínio de meu ser: ter na mão um papel.
Confabular com meu íntimo, selar minha inspiração.
Possuir o lugar, onde eu possa recrear meu céu.
Retirar a venda dos olhos e a poeira da emoção.

Escrevo - pois me reinvento a cada letra, cada verso.
O novo é o que flameja, estimula e completa.
Deito a mão o que o pensamento goteja adverso.
Isso me faz grandioso. Isso me faz poeta.

“Quem possuiu a alma de poeta, aprende a ver beleza até na pestilência.”
Thaís Milani

Monge Apaixonado


Longe.Estou tão só. Tão longe.
Enclausurado em meu próprio mosteiro,
Ajoelhado e prostrado, como um monge.
Teu retrato o meu cilício, meu cativeiro.

Da torre mais alta, observo o mundo guiar-se.
O rio seguir seu curso, o viajante caminhar,
Vejo o céu e seu negrume, aves a proliferar-se.
Contudo, permaneço só. Com seu rosto em meu altar.

Abaixo de meu hábito, esconde-se o ardor.
Habita meu ser, desejo de tocar-te, o mal.
Flameja em meus olhos, teu calor.
Perdoe-me Céus, por amar um ser tão angelical.

Dessa maneira, trucidante. Busco um reencontro.
Não sou mais sã, tampouco santo;
Reconheço em meus olhos a dor do desencontro.
Em minha face, sua partida é doce pranto.

Prostituta


Lá estava ela. Com os mesmos olhos tristes de toda vida,
Formando par com o corpo coberto de dilacerações.
Enterrados e sobrecarregados com tantas feridas
Extravasando no sangue rubro a morte das sensações

Em seu luto encoberto jazia o sonho,
Que os olhos tristonhos amavam entoar
Um resoluto sentimento enfadonho.
De vez ou outra ser adorada e ensinada a amar.

Era moça de sorrisos, com a alma de pescador,
Margeando o rio da felicidade com um barquinho de papel.
A menina delicada, com o rosto coberto pelo véu do ardor
Vivendo das graças e desonras da Senhora do Bordel.

Uma morte rude e irônica, a partida mal chorada.
Abrigado na Terra dos Desejos há um corpo em distinção,
Maldito e pecaminoso, descansando na despedida pouco lamentada.
Da moçoila que não possuía restrição.

O enterro vazio, com precários frequentadores e uma vaga lamentação,
Encerrava a abrasadora vivência de um ser ávido por compreensão.
Entregue ao sopro da luxúria, ostentando a esperança,
De que alguém com que partilhou a cama, lhe carregue na lembrança.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Segundo a Segunda


Hoje é segunda; Segura minha mão.
É dia de maria e dia de joão.
Segunda-feira, primeira desilusão
Algo de errado meu irmão?

Não é o fim do mundo
Só o começo do mês.
A primeira segunda.
Ainda me faltam três.

Tenho o sorriso de poeta,
Enquadrado em meu olhar
Mas na segunda, tudo é esperar.
Sentando em um banco; Tudo é estar.

Me contam, abstratos de vidas pacatas
Seria muita ousadia?
Se dissesse que hoje não é dia,
Que a vida está parca.

O que me dizes é notícia de segunda.
Que dobra a esquina, em bordô de costureira
Notícia de Joana, a velhota de grossa bunda.
Que comenta de todos, por beira.

Corrimãos dessa feira, são pequenas perdições
Em dia como tal, não há grandes feições,
Segunda é dia ganhar a guerra.
È dia de chorar o pranto e também lavrar a terra.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Flor


Por ande andavas,
Tu, ó Flor, que eu plantei,
Por qual trilha caminhavas
Procurei-te e não avistei.

Por que tu não retornas
ao meu belo jardim?
Para eu regar-te e amar-te
Como desejavas no fim.

Pois, que erro cometo eu
Se não tenho boas mãos de jardineiro?
Se ao tocar no broto, nasce logo um brotoejo.
Correrei para o teu lar, onde encontro paradeiro?

Desde o fim de nossa primavera
Venho eu sofrendo a míngua, mágoas da paixão.
Nas águas que rolam do rosto, encontro a solidão.
Nas águas quem descem do morro, marcas que restarão.

Mãe Celeste


Tu que és como eu.
Com faces ocultas e intransponíveis,
Quando só, inerte no breu.
Presa a fios intransigíveis.

Flutua, com mãos divinas a te firmar
Me observa, em noites frias e vagas,
Acalenta, tortura e afaga
Amante do céu, prisioneira do mar.

Cubra-me com teu manto brumoso.
Anseio por teu olhar piedoso,
Sofro, quando nuvens a cegam.
Morro, quando olhos te negam.

Tu, que para mim és como o véu.
A raínha, a dama do céu.
A chama dos amantes,
Luz nas noites errantes.

Dá-me tua graça. Dá-me teu explendor,
Derreta minha alma com teu brilho.
Compadeça-te deste pobre andarilho.
Encha o vazio com teu amor.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Canta Jurema, canta!


Jurema, era o nome que avançava pela rua
Deixando muitos a cantarolar
Vindo de banda, completamente alienada
Jurema tocava a todos, sem nada tocar.
Colocava a boca no trombone
Adorando ouvir o som grave escapar.
Seu instrumento preferido era a pervesão
Ao seu doce toque, acelerava coração.
Todos requebravam ao seu caminhar
Desde cedo ela gostava
De cantar à vizinhança
Por causa de tal talento
Foi abandonada quando criança
Lançada ao vento
Batucou o despudor
Áh... Jurema, como danças com explendor.
A sua música era forte
Desbancava trovador
E quando ela cantava
Ouvia-se, "mais, mais meu amor"
Tantos homens ja uivaram
Durante o seu cantar
Poucos homens, de sorte
Receberam sem pagar.
Ouvindo noite a fora, sua gaita soar.
Ela tinha um dedilhado
que ninguém fazia igual
Arrancava melodia
Até de varetas de pau.
Coçava para baixo - Quando lhe pedia
Coçava para cima - Quando o desejo ardia.
Jurema era música, de alma
Jurema era cantora, de palma
Jurema não tinha carteira assinada.