sábado, 2 de outubro de 2010

Meu Pedaçinho de Terra.


Nasci em uma terra
Onde o chão é rachado;
Os semblantes maltratados
Onde o povo vive de crer.

Na minha terra
[Que não é minha]
Todo dia tem romaria,
O padre reza a ladainha
E me dá fé para vencer.

A água que é tão rara
Mora dentro do açude.
A gente viaja de pau-de-arara
Mão cansada e peito rude.

Quando a água despeja do céu
Forma a lama bem-vinda.
A viúva retira o véu,
Em festa a noite finda

Minha terra tem passarinho
Com o peito miádo vive a cantar;
Canto este que afasta o espinho
E lembra o cheiro do mar.

A terrinha ressacada
Abriga as mãos sofridas.
Não tem remédio para ferida
Não há água fonte da vida
E comida também não há.

Os trapos que peito cobre
São finos, cosidos à mão.
Mãos tão calejadas e tão nobres
Mãos que acalentam o chão;

A única água que corre
É aquela que dos olhos caí.
Quando um dos filhos morre
Da fome que nunca saí.

Já tentei plantar de tudo,
E de tudo, nada nasceu.
Não quero sair para o mundo
Este lugar também é de Deus.
Não quero sair do mundo
Aqui é feliz o peito meu.

Os bracinhos afinados
Dos tantos filhos que Deus me deu
Todos eles foram criados,
Na terra onde o sol assola
Que é onde cada um cresceu.


Os pés livres e bem andados,
Solado nunca viu.
O chão quente e árido
Calçaram e bem serviu.

A perninha murcha;
Seca de tanto andar.
Os cabelos feitos bucha
Sem ter água para lavar.

A cor dourada que o usufruí
Não é ouro, riqueza não há.
O tesouro que possuí
É o que na terra se enterrará

Aprendi sozinho nesta terra
A fome é nossa guerra.
E não temos armas para lutar.

Aprendi sozinho nesta terra
Minha luta não se encerra.
Enquanto a morte não chegar.

Aprendi sozinho nesta terra
O que este meu peito berra.
Ninguém quer escutar.

É tanta aridez,
Falta de sensatez,
Que chega a me afogar.
Um afogamento doloroso
Nem tem meio aquoso
Que se possa constatar.

Se chorar criasse rios,
Meu sertão seria a terra
Mais rica que a serra
Onde mais água há.

Se chorar acalentasse a fome,
Dos mirrados abdomes
Meu sertão seria a terra
Que minha tristeza desferra
Onde comida há.

Aprendi sozinho nesta terra
O medo que em meu peito ferra,
È que eu morra sem vê-la prosperar.

Aprendi sozinho nesta terra
Que minha vida soterra.
A ser feliz, sem reclamar.

4 comentários:

Ketley disse...

Thaís, serio mesmo! é impressionante a maneira como vc escreve! Muuito bom mesmo. Parabéns! Beijoo =DD

Thaís Milani disse...

Obrigada Ketley *---*
:*

Anônimo disse...

Putz, gostei d+ desse!
Expressou de forma clara a vida dura e desgastante de um povo que tanto sofre pela escassez de água, que não tem outra escolha a não ser lutar numa terra seca e rezar por dias melhores.




Paulo.

Thaís Milani disse...

Obrigado :)